Há algumas semanas participei de uma reunião de briefing para o desenvolvimento de uma nova identidade visual para uma empresa que está se propondo a trazer uma nova abordagem para o segmento de seguros. Em algum momento a conversa foi para um lado que eu não esperava. Os proprietários da empresa e potenciais clientes começaram a conversar com o meu chefe sobre aviões, helicópteros e carros importados. Por não conhecer muito desses produtos, permaneci calado e na posição de observador. A conclusão da conversa foi bem simples: nós nos sentimos mais seguros dirigindo um carro do que pilotando um avião, mesmo que comprovadamente o avião seja mais seguro. Eu fiquei me perguntando quais eram os motivos.
Cheguei a minha conclusão: o ser humano tem complexo de Deus. No carro, importado ou não, nós estamos no controle. No avião, nós somos apenas passageiros. Comecei a entender que essa era uma ótima metáfora para a vida. A vida é um avião e nós somos apenas os tripulantes. Mesmo que seja instintivo, é preciso compreender que controle é uma coisa que não existe, principalmente no século 21. Bauman, dos mais lúcidos sociólogos do seu tempo, definiu a nossa modernidade como líquida. As relações, as pessoas, o mundo é fluído e incontrolável. E aqui está o grande paradoxo do mercado atual. O empresário da geração passada foi ensinado a ter o controle, a verdade e as respostas todas ao seu lado. Vivemos em meio a empresas que não conseguem conviver com dúvidas, incertezas e questionamentos. Isso cria uma realidade onde a credibilidade e o engajamento não existem mais. Seguem alguns problemas que várias corporações estão vivendo: falta de fidelidade dos seus clientes, alta rotatividade de colaboradores, líderes incapazes e pouco empáticos, alta frequência de atritos internos e mau desempenho na ponta.
Segundo pesquisa da Nielsen de 2018, a taxa de mortalidade dos lançamentos da indústria de bens de consumo rápido é superior a 80%. Isso significa que a cada 100 produtos lançados de grandes marcas que nós conhecemos da tv, 80 são jogados no lixo. E eu tenho uma outra novidade, isso só tende a piorar. Porque as pessoas que tem o maior poder de consumo atualmente já têm opções demais. É preciso criar algo que vá além do benefício funcional do produto. A pirâmide de Maslow mudou! Nós, seres humanos, não nos contentamos mais com a satisfação de nossas necessidades básicas, como segurança, sobrevivência e autoestima. A busca hoje é por propósito e construção de comunidades.
Construir um norte que faça sentido, fazer com que essa direção se manifeste para todas as pessoas que estão em volta da sua organização, conscientizar os líderes da empresa e fazer com que essa cadeia se manifeste em forma de cultura, só será possível se os empresários começarem a olhar para dentro e reconhecer que algo está errado. Como já disse o também sociólogo Jesse Souza, “quem não sabe quem é, nunca aprende. Quem nunca aprende, repete”.